Let me forget about today until
tomorrow.
Bob
Dylan
A difícil tarefa de despertar para
mais um dia, a mão da mãe nas costas, uma leve chacoalhada:
- Tá
na hora filha.
- Só
mais cinco minutinhos!
Café, escova, pasta, mochila e lá ia
ela para mais um dia de aula. Amigos, pessoas às quais era indiferente, e
aqueles de quem de fato não gostava. Tudo sempre igual.
No início da aula, a professora
colocou a data na lousa, 21 de maio de 2012:
- Uau!
Tá quase no meio do ano!
Em alguns momentos sentiu seu
interesse desperto, já em outros cedeu à pressão e não tirou a mochila das
costas, chegando até a cochilar.
A tarde em casa, precisava saber da
sua popularidade no facebook, mas não
tinha recebido nenhuma cutucada, dentro de si dizia: - Acorda filha, ninguém lembra
que você existe!
A televisão era uma boa companheira,
nem que fosse para fazer musculação no polegar, mudando de canal, como se a tal
ação fizesse aparecer algo de bom na programação.
No fim do dia, em seu quarto, o diário
aberto em 21 de maio, relatos pessoais, não leitor curioso, ninguém saberá os
segredos da nossa heroína, não ao menos por mim.
Noite, madrugada, e já estava
chegando à hora de acordar de novo, novamente, a mão lhe chamava, um pouco de
resistência, mas acabava indo sempre rumo à sua rotina.
Durante a primeira aula, o professor
colocou a data no quadro, ela logo sorriu, e disse cheia de orgulho:
- Tá errado, hoje é dia 22.
Ao olhar pro lado, nenhum riso no
semblante dos colegas, quando um deles lhe disse:
- Ô apressadinha, hoje ainda é 21.
- Não gente, vocês tão viajando?
O silêncio ecoou como resposta.
Desencanou, mas em todas as aulas, lá estava no bordo superior da lousa: 21 de
maio de 2012.
Conferiu em seu celular e a mesma
data estava lá, no relógio de pulso do seu ficante, os mesmos algarismos.
Em casa, no final do dia, ao abrir o
seu diário, estava em branco à página do vigésimo primeiro dia de maio. Não
podia conversar com ninguém, pois só para ela o dia parecia se repetir, fez um
voto de silêncio, se não fosse pelas suas olheiras, não poderiam dizer que
havia algo de errado com ela. Chegou a ficar acordada por vários dias até meia
noite, como se fosse à guardiã do calendário, mas de nada adiantou, na manhã
seguinte estavam lá aqueles dois algarismos que pareciam persegui-la.
Trinta vezes depois que 24 horas se
aglomeravam sob a mesma data, a visita do pai, que há cerca de três meses não
encontrava, trouxe um pouco de conforto, ao abraçá-lo, olhou em seu pulso, era
junho, os fogos no céu moviam os astros, era festa de são João.
Para quem poderia contar o ocorrido,
não queria passar por doida, talvez, na velhice, pudesse narrar o fato aos
netos, pois as crianças, talvez, ainda poderiam sonhar.
1 Comentário
Esta eu conhecia Fernando, tanto a história, quanto a rotina. Como já te disse uma vez, lembrou-me o filme Feitiço do Tempo, com Bill Murray e o livro A guerra do tempo, do Alejo Carpentier. Sou cada vez mais fã da sua escrita. Gostei tb da epígrafe, não tinha na outra versão acho. Abração.
Daniel Lopes
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