sexta-feira, 31 de maio de 2013

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ENTREVISTA COM A ESCRITORA MÁRCIA BARBIERI

Márcia Barbieri é paulista, graduada em Portugês/ Francês pela Unesp, pós-graduada em Prática de criação literária, org. Nelson de Oliveira, mestranda em Filosofia pela Unifesp.
 Autora dos livros de conto Anéis de Saturno (Clube de Autores: 2009), As mãos mirradas de deus (Multifoco: 2011), além de ter diversos textos publicados em conceituadas revistas literárias, edita o blog: A vida não vale um conto desde 2008.
Neste ano lançará o romance Mosaico de Rancores, pela editora Terracota. No último ano, publicou alguns capítulos do romance A Puta, no portal O-bule, no qual atua como colunista.

 Em quais aspectos ter vindo morar em São Paulo influenciou sua escrita?

Não sei dizer o quanto me influenciou ter vindo para São Paulo em minha escrita, talvez o mais importante tenha sido o acesso a pessoas e cursos que jamais teria em minha cidade, parece que aqui é mais fácil estar sempre perto da escrita, lá eu me sentia mais longe... Embora eu tenha saído com vinte dois anos (e cheguei a São Paulo com vinte e seis) e tudo ainda era confuso, eu já sabia que escrever era minha vida, por isso a escolha pelo curso de Letras, mas ainda não pensava em produção, ter uma obra, só pensava em escrever, sem a pretensão que tenho agora, por outro lado, não sei se ter pretensões é positivo...

A literatura está na escrita ou na edição de um livro?

A literatura está com toda certeza na escrita, mas a edição do livro pode arruinar ou elevar a escrita.

Segundo Roman Jacobson, a ênfase na mensagem constitui a linguagem poética, em sua escrita há uma linha tênue entre a prosa e a poesia, como seu romance Mosaico de rancores será traduzido para o alemão, você teme que o leitor estrangeiro não sinta o seu texto ao lê-lo?

Vejo a tradução como a adaptação de uma obra. Acredito que eu estarei em algum grau na obra depois de traduzida, mas não sei se poderei dizer que a escrevi, a tradução é uma espécie de reescrita e muita coisa se perde, outras aparecem. Para mim, o mais legal foi alguém (o editor) acreditar na minha escrita.

Você tem textos publicados em diversos portais de literatura, além do seu próprio blog. Acredito que leia textos de outros autores na internet. Quais as diferenças que você sente entre a leitura web e no veículo livro?

Acredito que a desvantagem de se ler um texto na web é que você sempre está lendo e fazendo outras coisas ao mesmo tempo e acho que isso dificulta um pouco o envolvimento com a obra do autor, às vezes, você quer voltar ao texto, mas aparecem outros textos, outros autores, é tudo muito rápido. Já o livro impresso você tem a vantagem de deixá-lo na cabeceira da cama e cada dia mergulhar um pouco, com calma, com atenção, além disso, é mais confortável a leitura.

É possível escrever o silêncio?

É quase impossível presenciar o silêncio... Todo escritor, no fundo, tem a intenção de escrever o silêncio, mas o silêncio é divino, não é humano. No livro que acabei de finalizar A puta, um dos personagens, o Poeta, tenta escrever um livro, o primeiro livro de uma nova era, ele abre com uma epígrafe: “As palavras dos homens são grunhidos perante o silêncio de Deus” e eu também acredito nisso, só Deus tem o poder da construção silenciosa, o homem é ruidoso o tempo todo, todos os dias, todos as horas, todos os minutos, todas as obras não passam de um desencaixar de mandíbulas...

Marcelo Ariel afirma que a linguagem é uma doença. Escrever te cura ou te adoece?

Não sei se concordo que a linguagem é uma doença, talvez, porque as coisas ficam mais simples quando ela é extirpada... De qualquer forma, eu adoeço apenas quando não estou escrevendo, quando não escrevo me sinto oca e penso nisso a cada instante, sinto que poderia estar morta, me sinto inútil. Pra mim, escrever é como um pico na veia, delirante e preciso disso, não conseguiria viver sem...

 É possível reconhecer um texto seu pela idiossincrasia. Você tem medo de se repetir? O que faz para vencer as acomodações da estética?

Tenho, tenho um medo tremendo de me repetir e acho que tudo o que faço se repete, porque são minhas obsessões, não posso me desligar delas... Nesse romance que falei A Puta tentei não me repetir, mas tenho minhas dúvidas se consegui. A cada livro que escrevo tenho uma necessidade muito grande de me diferenciar, de experimentar, adoro experimentar a linguagem, ver até onde consigo ir, não sei dizer se consigo... Talvez para uma escritora eu ainda seja nova, tenho certeza que morrerei por volta dos noventa anos, até lá acho que terei tempo para ser diferente...

Você publicou capítulos do romance A Puta em O Bule. Como é construí um romance e antes de tê-lo terminado, possuir a resposta dos leitores? Isso interfere no processo criativo?

Eu gosto de ver a reação dos leitores, mas não mudaria por causa deles, eu sou muito teimosa... Além disso, quem comenta normalmente é conivente... Acredito que o escritor não procura seus leitores, a obra encontra seus leitores.

O seu romance Mosaico de Rancores começou a ser postado em seu blog em 2008, este será lançado neste ano. O que mudou em sua escrita de lá para cá?

Como disse, eu vivo me repetindo, mas acredito que a minha escrita esteja mais madura, menos medrosa... Eu não me reconheço mais no Mosaico de Rancores, talvez seja um problema comum, depois que acabo uma obra dificilmente gosto dela...


Há algo que não foi perguntado e é importante para compreendermos a literatura que você pratica?

A única coisa importante para entender minha literatura é se deixar levar pelas sensações e pelos ritmos das palavras... Quando eu digo cavalo, eu não falo do seu corpo musculoso e infalível, quando digo cavalo, eu penso no barulho dos cascos galopantes...

3 comentários

Carlos Éldani Davissara

Linda entrevista. A autora nos transmite a beleza de entregar-se à criação artística. Há muita sinceridade nas palavras. Parabéns ao site, ao entrevistador e à escritora. Que os lançamentos próximos sejam um sucesso! Abraços!

Anônimo

Parabéns!

Oneide Duarte

Eu li oufindo a foz ta Marcia,pessoa que tifi a honra de trapalhar e ter loncas horas de confersa. Saudades.