O cenário era de horror, porém o mais assustador é que não se tratava de
um filme trash, mas sim da vida real! Sob o piso gelado da cozinha, dois corpos
caídos, de um homem e de uma mulher, rígidos, sobre uma grande e arrepiante
poça de sangue. Por cima estava o marido, que mantinha presa na mão direita uma
faca pontiaguda e afiada,ainda com as marcas do bárbaro crime, posicionada
entre ele e a mulher.
A faca em questão, ironicamente parecia unir os dois: o que eles não
conseguiram em vida, a morte se encarregou de fazer.
Quinze facadas desferidas brutalmente no abdômen da mulher foi a
resposta encontrada pelo marido para aplacar a própria fúria. Se faltou diálogo
e bom senso, sobrou ódio e intolerância.
A cólera também o levou a sacar da mesma faca para provocar a própria
degola, um gesto insano e cruel seguido de outro. Instrumento e testemunha ao
mesmo tempo de um crime bárbaro, a faca se mantinha ali, imóvel, à espera do
próximo ato. O relógio recém tinha batido as duas badaladas da tarde do dia 21
de fevereiro, na entrada da lua cheia...
Três horas se passaram até que os dois filhos do casal, de 11 e oito
anos, voltassem da escola e se deparassem com a tragédia. Subitamente órfãos,
seu maior desafio é seguir em frente e vencer o trauma, sem serem
estigmatizados.
Na cozinha do casal, o crime passional deixou de ser particular e se
tornou público.
Agora as consequências do uso da faca não vitimaram somente os dois, mas
e estenderam aos filhos, aos familiares, amigos e toda a comunidade,
ultrapassando os limites do Vale do Itapocu.
Será que se trata de um crime anunciado? Teria sido a vítima pega de
surpresa, por crise de ciúme ou loucura momentânea do marido? Estaria ela “dormindo com o inimigo”,
passivamente, sem coragem ou forças para denunciar seu algoz?
As perguntas permanecem no ar, o velório acontece, o enterro se faz e a
vida segue... Até quando a sociedade vai continuar omissa a fatos como esse? Até
quando as mulheres vão aceitar serem agredidas sem buscarem seus direitos? E as
testemunhas de vítimas de violência doméstica, será que vão continuar calada,
incentivando para que o machismo e a intolerância masculina permaneçam impunes,
mesmo após a conquista da Lei Maria da Penha?
É noite, o sol se pôs. As pessoas voltam ao trabalho, leem os jornais,
assistem ao noticiário da televisão e depois vão dormir. Amanhã PE outro dia, e
um novo sol vai nascer, enchendo de esperança os corações, mais uma vez.Está na hora de acordar!...
Texto que integra a obra “Crônicas de Maria e outras tantas – Um Olhar
sobre Jaraguá do Sul”, publicado em julho de 2009 pela Design Editora.
Sônia Pillon é jornalista e escritora, nascida em Porto Alegre (RS) e radicada em Jaraguá do Sul (SC), Brasil.
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