segunda-feira, 17 de março de 2014

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ENTREVISTA COM O ESCRITOR GLÁUBER SOARES





Já no início de 2014, Gláuber Soares faz sua estreia literária, nos prescrevendo seu Remédio Forte (Terracota), o qual contém 22 contos, espalhados em 113 páginas, que podem ser lidos em apenas uma sentada, sem perigo de causar qualquer efeito colateral.
O escritor nasceu em Itabuna (BA). Vive em São Paulo desde 1983, formou-se em Jornalismo. Participou das coletâneas de contos: Abigail (2011), Dos medos o menor (2012) e A arte de enganar o Google (2013). Mantém o blogue Glaub TI: www.glaubersoares.com.br

Parece haver uma distinção entre aquele que escreve textos literários e os publica em blogues, redes sociais e afins e o escritor, sujeito que tem um livro publicado. Como você percebe isso?
Talvez alguns façam mesmo esta distinção, como se o escritor com livro publicado estivesse num patamar acima. Para mim literariamente depende sempre da qualidade do texto, independente da mídia.

Em seu livro de estreia Remédio Forte, a passagem do tempo está presente como um dos temas centrais. Como este tema te afeta?
Me afeta de forma natural. Como o tempo não para, coloco-me impassivo a observar o seu rastro de construção e destruição, nem sempre nesta ordem. Procuro o lirismo em suas rugas, a verdade entre os escombros. Depois, com ajuda da literatura, eu o aprisiono em algumas páginas – é a minha vingança.

Não ser nascido em São Paulo, cidade na qual você vive, te possibilita ainda ter um olhar estrangeiro sobre a metrópole-caos? Como isso influencia sua escrita?
Mesmo que eu chegue aos noventa anos morando em São Paulo ainda assim me sentirei um estrangeiro. Se tivesse nascido aqui provavelmente não amaria tanto esta cidade. Eu não queria sair de minha Itabuna, mas aos quatorze anos tive que escolher entre morar no Rio ou em São Paulo. Apesar de gostar do Rio, acho que fiz a escolha certa. Espanto repulsa, encantamento, admiração, as múltiplas sensações que sentimos ao conhecer uma cidade, as sinto a todo o momento em São Paulo e, claro, se refletem na minha escrita.

Sem o sarcasmo contido em algumas narrativas de Remédio Forte, você poderia ser tido como um escritor fatalista. Como esta distinção acontece na concepção de seus textos? É algo racional ou intuitivo?
Algumas vezes racionais, noutras intuitivas. A vida é fugaz. Enquanto a morte não chega, estamos, quase sempre, celebrando o nada. Somos o gado que rumina na fila do abatedouro, sendo o nosso capim os smartphones, a tevê e agora também o Facebook.

Você participou de algumas oficinas literárias, no que elas contribuíram para a sua escrita?
Contribuíram bastante. O meu primeiro romance – não publicado – finalizei ele em 2002. Ainda não havia participado de oficinas literárias. Tinha preconceito. Neste período eu trabalhava como repórter no Jornal da Tarde. Quando ia pra literatura meu texto continuava jornalístico, explicativo demais. Somente a partir do final de 2010, por indicação de uma amiga, participei de uma série de oficinas na Terracota. A experiência foi excelente. Minha escrita amadureceu. Na prosa e poesia tive aulas com os escritores Luiz Bras, Marcelino Freire, Edson Cruz – lá descobri que um dia eles foram alunos de oficinas literárias, não havia pecado. Importante também são os contatos, muitos colegas viraram amigos. Mas o processo é dolorido, assim como elogios, há críticas, às vezes duras. Além da escrita, você precisa dominar o seu ego ou então desiste.

Qual a principal contra indicação do seu livro?
Para este Remédio Forte não há contra indicações. Mas em caso de suspeita de dengue pare de ler e corra pro hospital.

Os contos foram escritos como projeto para um livro ou você compilou textos acumulados ao longo da sua vida-de-escritor?
Rolou uma mescla. Alguns contos foram escritos pensando no livro, mesmo testando antes em blogues, como Uma Tarde de Sorte, por exemplo. Do “estoque” procurei selecionar os que tinham a mesma unidade.

A linguagem concisa que você utiliza na lapidação dos seus contos é uma tentativa de concentrar o pouco que importa no muito que há de vida ou é apenas uma questão de estilo?
Está mais para estilo. Quando a frase começa a ficar grande acho que estou enchendo linguiça.

O que é escrever para você? É uma forma de salvação da falência total que é a vida?
Ao transformar uma imagem num texto se o resultado final me agradar: escrever é uma grande satisfação.

Te atormenta confundirem sua obra com a sua vida?
(risos) Não adianta dizer que ali não sou eu, então, na boa: Madame Bovary sou eu mesmo.

Em algumas de suas narrativas temos a sensação de que o narrador é alguém dotado de uma super-visão, este artifício se deve a sua formação em Jornalismo?

O jornalismo me ajudou no senso crítico, menos pela formação acadêmica ou trabalhando, mais como leitor que sou (ou era) desde adolescente. Sobretudo se deve a música. Cresci ouvindo Geraldo Vandré, Raul Seixas, Luiz Gonzaga. Depois vieram Os Paralamas com Alagados, Legião Urbana, Smiths, U2, Camisa de Vênus, Plebe Rude, Inocentes... minha visão de mundo e reflexões se deram a partir da música.

2 comentários

Unknown
Este comentário foi removido pelo autor.
Unknown

Li o livro Remédio Forte de Glauber Soares, e percebi um senso crítico com sutileza política sem deixar de ser atual... parabéns pelo trabalho.