Já
no início de 2014, Gláuber Soares faz sua estreia
literária, nos prescrevendo seu Remédio Forte (Terracota), o qual
contém 22 contos, espalhados em 113 páginas, que podem ser lidos em apenas uma
sentada, sem perigo de causar qualquer efeito colateral.
O
escritor nasceu em Itabuna (BA). Vive em São Paulo desde 1983, formou-se em
Jornalismo. Participou das coletâneas de contos: Abigail (2011), Dos medos o
menor (2012) e A arte de enganar o Google (2013). Mantém o blogue Glaub TI:
www.glaubersoares.com.br
Parece haver uma distinção entre aquele que
escreve textos literários e os publica em blogues, redes sociais e afins e o
escritor, sujeito que tem um livro publicado. Como você percebe isso?
Talvez alguns
façam mesmo esta distinção, como se o escritor com livro publicado estivesse
num patamar acima. Para mim literariamente depende sempre da qualidade do texto,
independente da mídia.
Em seu livro de estreia Remédio Forte, a passagem do tempo está
presente como um dos temas centrais. Como este tema te afeta?
Me afeta de
forma natural. Como o tempo não para, coloco-me impassivo a observar o seu
rastro de construção e destruição, nem sempre nesta ordem. Procuro o lirismo em
suas rugas, a verdade entre os escombros. Depois, com ajuda da literatura, eu o
aprisiono em algumas páginas – é a minha vingança.
Não ser nascido em São Paulo, cidade na
qual você vive, te possibilita ainda ter um olhar estrangeiro sobre a
metrópole-caos? Como isso influencia sua escrita?
Mesmo que eu
chegue aos noventa anos morando em São Paulo ainda assim me sentirei um
estrangeiro. Se tivesse nascido aqui provavelmente não amaria tanto esta
cidade. Eu não queria sair de minha Itabuna, mas aos quatorze anos tive que
escolher entre morar no Rio ou em São Paulo. Apesar de gostar do Rio, acho que
fiz a escolha certa. Espanto repulsa, encantamento, admiração, as múltiplas sensações
que sentimos ao conhecer uma cidade, as sinto a todo o momento em São Paulo e,
claro, se refletem na minha escrita.
Sem o sarcasmo contido em algumas
narrativas de Remédio Forte, você
poderia ser tido como um escritor fatalista. Como esta distinção acontece na
concepção de seus textos? É algo racional ou intuitivo?
Algumas vezes racionais,
noutras intuitivas. A vida é fugaz. Enquanto a morte não chega, estamos, quase
sempre, celebrando o nada. Somos o gado que rumina na fila do abatedouro, sendo
o nosso capim os smartphones, a tevê e agora também o Facebook.
Você participou de algumas oficinas
literárias, no que elas contribuíram para a sua escrita?
Contribuíram bastante.
O meu primeiro romance – não publicado – finalizei ele em 2002. Ainda não havia
participado de oficinas literárias. Tinha preconceito. Neste período eu
trabalhava como repórter no Jornal da
Tarde. Quando ia pra literatura meu texto continuava jornalístico,
explicativo demais. Somente a partir do final de 2010, por indicação de uma
amiga, participei de uma série de oficinas na Terracota. A experiência foi excelente. Minha escrita amadureceu.
Na prosa e poesia tive aulas com os escritores Luiz Bras, Marcelino Freire,
Edson Cruz – lá descobri que um dia eles foram alunos de oficinas literárias,
não havia pecado. Importante também são os contatos, muitos colegas viraram
amigos. Mas o processo é dolorido, assim como elogios, há críticas, às vezes
duras. Além da escrita, você precisa dominar o seu ego ou então desiste.
Qual a principal contra indicação do seu
livro?
Para este Remédio
Forte não há contra indicações. Mas em caso de suspeita de dengue pare
de ler e corra pro hospital.
Os contos foram escritos como projeto para
um livro ou você compilou textos acumulados ao longo da sua vida-de-escritor?
Rolou uma
mescla. Alguns contos foram escritos pensando no livro, mesmo testando antes em
blogues, como Uma Tarde de Sorte, por
exemplo. Do “estoque” procurei selecionar os que tinham a mesma unidade.
A linguagem concisa que você utiliza na
lapidação dos seus contos é uma tentativa de concentrar o pouco que importa no
muito que há de vida ou é apenas uma questão de estilo?
Está mais para
estilo. Quando a frase começa a ficar grande acho que estou enchendo linguiça.
O que é escrever para você? É uma forma de
salvação da falência total que é a vida?
Ao transformar
uma imagem num texto se o resultado final me agradar: escrever é uma grande
satisfação.
Te atormenta confundirem sua obra com a sua
vida?
(risos) Não
adianta dizer que ali não sou eu, então, na boa: Madame Bovary sou eu mesmo.
Em algumas de suas narrativas temos a
sensação de que o narrador é alguém dotado de uma super-visão, este artifício
se deve a sua formação em Jornalismo?
O jornalismo me
ajudou no senso crítico, menos pela formação acadêmica ou trabalhando, mais
como leitor que sou (ou era) desde adolescente. Sobretudo se deve a música.
Cresci ouvindo Geraldo Vandré, Raul Seixas, Luiz Gonzaga. Depois vieram Os Paralamas
com Alagados, Legião Urbana, Smiths,
U2, Camisa de Vênus, Plebe Rude, Inocentes... minha visão de mundo e reflexões
se deram a partir da música.
2 comentários
Li o livro Remédio Forte de Glauber Soares, e percebi um senso crítico com sutileza política sem deixar de ser atual... parabéns pelo trabalho.
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