Tenho
lapsos de memória, então, busco em bilhetes os recados, como vínculo de
convivência. Encontro em Fernando Karl, “...te
espero em qualquer esquina / para tomarmos um banho de chuva”.
O bilhete é recado de contato
que demonstra sensibilidade e
consideração para com a minha vida. Através dele meus sentimentos de
inadequação e vazio desaparecem. A autoestima aumenta no recado em que o teor
das palavras me atinge.
No meu mundo, mudanças explicam
o significado e a importância do bilhete deixado no mural, na porta da
geladeira, no espelho do banheiro, na tela do computador e na agenda – na falta
da memória e de tempo para me encontrar junto ao acúmulo de compromissos. Isto
difere de um bilhete para o outro, porque a maneira como me expresso deixa
marcas no tempo. Agostinho Both, conta, “...
Pippo escreveu no bilhete, provocação pura: “Chiruzedo de bosta! Não vou botar
rabicho em vocês, por não haver modo de segurar!”
O tempo me faz lembrar que,
enquanto estudante, todas as manhãs, na minha carteira da sala de aula, havia
um bilhete para mim do garoto que estudava à noite e ocupava a mesma
localização. Nossa comunicação foi importante: gesto de amizade que permanece
até hoje.
Outra lembrança é a da minha
casa: no corredor entre os quartos havia o mural de recados, ao lado do quadro
de Raul Córdula, onde deixávamos bilhetes com as atividades, horários e
novidades do dia; com a finalidade de participar da vida do outro e organizar
nossas vidas ao revelar os pensamentos.
Sei que é possível harmonizar o
que parece inconciliável através de bilhetes, que revelam segredos para
entendermos a corrida do dia a dia; entre o mundo e eu, até chegar a nós. A
expectativa é estimulada por que, neles marco o encontro para sacudir a minha
rotina e me beneficiar da memória.
Hoje, vejo que o bilhete foi
trocado pela mensagem eletrônica, o que pode equivaler como iniciativa de
significado do ato em si e preservar a memória para o meu bem viver. Nas
palavras de Lindenberg Bronzeado, “No
olhar e nos gestos os homens se tocam como seres humanos, criadores de
encontros e despedidas”
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