Sempre dizia que não tinha graça pegar o fretado. Não acontece nada, o máximo
que pode acontecer é o ônibus furar o pneu, mais nada. Já o metrô acontece
coisas mais interessantes, todo o dia surge um fato novo para quebrar a
harmonia, todo o dia é gente nova que se descobre, cada macaco no seu galho,
como diz uma música, além do que é mais rápido que o ônibus. E as conversas que
o ouvido capta? Cada disparate, as brincadeiras dos jovens, as pessoas
apressadas, o corre-corre, os mochileiros com suas mochilas as costas
atrapalhando, as cotoveladas, os olhares feios, as paqueras, as pisadas no pé a
ponto do sapato ser arrancado, as brigas... E altas horas da noite! As noites
de sábado para domingo ou, mesmo de sexta para sábado, onde os atrasados se
desesperam para não perder o último metrô. Enfim, ele pegava, melhor dizendo,
pegou o metrô por mais de dez anos, de casa para a Paulista, da Paulista para
casa.
Mas como dizia aquele filosofo inconsequente: o
tempo não para. E sem perceber, os anos foram avançando e, quando deu por si,
estava na era do Condor. Com dor aqui, com dor ali, e outras dores. A pior era
a dor nas costas. Não podia ficar muito tempo em pé, a dor começava na cintura
e descia pela perna esquerda. E como sempre era difícil conseguir um banco para
sentar, isto porque, pegava o metrô na estação Tatuapé. Depois de muita
insistência dos amigos e familiares, resolveu passar para o fretado.
Assim sendo, apesar de uma hora prisioneiro, (é uma prisão assim como é
uma prisão ficar oito horas fechado num prédio fazendo o que não se quer), viu
as vantagens. Não precisava esperar um ônibus mais vazio, pois de casa até o
metrô ele pegava um ônibus. Estava fora do empurra-empurra. Chegava uma hora
mais cedo. Durante o trajeto podia dormir, cochilar, até roncar, ler, escrever,
olhar pateticamente pela janela, com o celular tirar fotos inusitadas da cidade
para colocar no blog.
Agora, depois de mais ou menos, três ou dois
anos, os donos da razão, empoleirados em seus poleiros políticos, estão
querendo restringir ou acabar com o fretado. Como dizia um motorista: o que
atrapalha o trânsito é os maus motoristas, os que compram a habilitação. Como
pode uma coisa dessas? Não é restringindo ou acabando com o fretado que o
trânsito da cidade deixará de ser caótico!! O que é preciso é uma
conscientização política, social eliminando os fraudulentos e os ladrões,
criando obras e situações que beneficiem o povo. Por outro lado, o povo também
tem que ter uma conscientização de vivência do que deve ser feito ou do que não
deve ser feito, ser mais atuante política e socialmente. Saber em que votar, e
não votar por votar.
E, mais uma vez, descendo do fretado em frente ao Conjunto Nacional, ao passar em frente a uma loja, disse a meia voz: então vou comprar uma bengala. E entrou na loja.
Seja o primeiro a comentar:
Postar um comentário