O sol batia na janela quando Malu acordou. Luciano deitado de borco, abraçado à perna de Malu, com a cabeça debaixo da coxa esquerda, parecia não querer acordar. Malu retirou a perna de cima da cabeça loira, e com o pé, sacudiu Luciano, que ao se virar para o lado esquerdo, caiu da cama. Sentada, divisou o olhar pelo quarto. Os dois rapazes dormiam um em cada poltrona, a mulher... bem, o travesti sentado no chão com a costa apoiada à parede, olhava para ela com cara de tédio. Sorriu ao vê-la acordada. Malu desviou os olhos.
Escorregou para a beirada da cama. Luciano ainda dormia no chão frio do assoalho.
- Acorda, Luciano, vamos acorda.
Sonolento, bocejando álcool fétido, o bafo foi de encontro ao rosto dela, obrigando-a a fazer uma careta de nojo.
- O que foi?
- Não vai levantar, não?
- Vou... espera, quero tomar um banho.
- Também quero tomar banho.
Entraram os dois no banheiro fechando a porta.
- Então, você quer saber como começou tudo isso?
- Sim, quero.
- Bom, meu pai é um cara demasiado liberal.
- Eu sei disso.
- Pois é, sei que você sabe. Foi ele que me trouxe para cá. Venho observando os dois há tempos. Desde o primeiro dia que você pisou o consultório do velho.
- Como assim?
- Ao lado do consultório tem uma sala pequena, onde meu pai às vezes observa os pacientes. Deixa-os por minutos sozinhos e por intermédio do espelho, aquele grande do lado esquerdo, observa o comportamento dos pacientes.
- E você...
- Sim, eu observava suas transas.
- Mas isso é um despudor inconcebível!
- Pode não ser ético.
- Seu cretino, como odeio você...
- Como você pode me odiar se me deseja.
- Quem lhe disse isso?
- Meu pai.
- Seu pai...
- Sim!
- Mas eu nada revelei a ele.
- Lembre-se que ele é psicanalista e dos melhores, apesar desse seu liberalismo às vezes descarado.
- Canalha.
- Quem? Eu ou meu pai?
- Os dois. E assim, os dois se divertiam as minhas custas.
- Garanto que sempre a desejei. Meu pai que veio com o plano de observá-los, pois ele se excita sabendo ser observado, entende?
- Vocês dois são mais paranóicos que eu.
- Bom, o caso é o seguinte: consegui e você conseguiu o que queria. Estarmos os dois juntos. E o que é melhor, dentro da banheira.
- Concordo. Mas depois dessa creio que não vou querer te ver mais e nem seu pai, por um bom tempo.
- Não faz isso, sei que gostou de mim como gostei de você.
- Veremos, veremos – respondeu Malu saindo da banheira.
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