Mestre Ninil,
Este
ano finalmente, caminhei pelas ruas da sua Cristina, as imagens dos seus livros
funcionaram como um mapa, para os olhos que conduziram meus pés.
Não
sei porquê, mas algumas das mulheres retratadas em seu último livro me
trouxeram algo kafkiano, elas pareciam esperar algo ou alguém, coisa ou gente
que não virá.
A
fotografia da sua mãe em duas das quatro capas dos seus trabalhos... Sinto a
sua mão se erguer e perseguir o corpo físico dela, sem conseguir tocá-la, ou de
repente, como se aquela estrada registrada se chamasse silêncio, você na outra
mão, de passagem, fitando-a por um daqueles instantes que usurpam a duração do
tempo, segue observando-a pelas costas, ela ao contrário da narrativa bíblica e
mostrando-se mais forte que Orfeu, mantém o olhar sempre para frente.
Mariza
aspira de olhos fechados o cheiro da flor, os cabelos brancos mostram que leva
tempo para conseguir bons resultados no árduo exercício da delicadeza,
Vicentina não fica para trás, ela demonstra a sutileza necessária para acolher
uma flor entre os dedos sem despedaçá-la. Como isso é possível?
São
Paulo é terra estranha, arrogante e hostil, imagina encontrar tempo para tocar
flauta para um cão, que ouve atento com olhar compenetrado? As águas estão
poluídas, cheiram mal, não há maestros que possam reger os rios tristes daqui,
neles não há música, só um silêncio sem transcendência.
Dizem
que o cinema de Win Wanders e o de Bergman possui forte conexão com a terra
natal deles penso que a sua fotografia possui semelhante ligação, o seu
fotografar transcende em Cristina.
Alquimia
a maneira como numa conversa você consegue sem pedantismo, tornar a sua
erudição possível de compreender, algo que não está estático numa bibliografia,
mas sim, que cabe na vida cotidiana, elevando o pensar do interlocutor,
suscitando dúvidas que logo viram interesse.
Tenho
orgulho de fotografar com uma câmera que foi sua, a fotografia tem me possibilitado
entrar em contato, sabe? Não sei se um dia serei um fotógrafo, mas saiba que
suas pesquisas acadêmicas tem em mim um porto no real, afinal, você reeducou
meu olhar com sua obra.
Um dia desses, estava fotografando na escola,
dois alunos daqueles apimentados, pediram para ver a câmera, eu falei um pouco
sobre o funcionamento do aparelho, logo, um deles fez um retrato bem bonito do
colega, no outro dia conversaram comigo sobre um trabalho de Artes, criando um
conceito para um ensaio sobre o futebol na escola, bobagem minha, mais sei que
vai gostar de saber disso.
De
alguma forma, tudo isso tem raízes em ti.
Meu
mais sincero afeto, obrigado por tudo!
Ninil Gonçalves é fotógrafo, poeta, Mestre e Doutorando em Educação, autor dos livros Absorções (poemas), Cristina nos olhos, Cristinidades e Cristinas, Terezas, Marias, Anas.. (fotografia).
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