terça-feira, 8 de junho de 2021

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LATIFÚNDIOS URBANOS






"As fazendas verticais são estruturas localizadas nos grandes centros urbanos, destinadas ao plantio de vegetais em camadas verticais. Este tipo de cultivo agrícola utiliza meios tecnológicos para a sobreposição de produção na mesma área, ou seja, a produtividade é intensificada devido ao aproveitamento do espaço aéreo sobre o solo. Em uma fazenda vertical a produção é feita de maneira protegida, na qual todas as variáveis possíveis são controladas, como iluminação, água temperatura e nutrientes. O resultado é uma produtividade altíssima sem a necessidade de agrotóxicos. Ocupando edifícios de vários andares, galpões, fábricas desativadas e outros espaços, garantem também uma logística de distribuição infinitamente mais rápida e mais barata, por estarem dentro das cidades e próximas aos consumidores."

Fonte: infoescola.com





Esteja a pandemia em que onda estiver ou mesmo arrefecendo, os home offices proliferam e consolidam sua permanência. Em lugar das cadeiras giroflex, o que gira nos antigos andares corporativos são aspersores regando nabos, rabanetes, brócolis e chuchus. Debaixo de uma iluminação artificial que varia entre o rosa e o roxo, fazendo lembrar as discotheques dos anos 70.



Os pequenos produtores rurais, que dependem da venda de sua escassa produção de hortifrútis e dos bons ventos meteorológicos, têm de se reinventar no curto prazo sem a menor ideia de para onde correr. É impossível, a céu aberto, ter a mesma produtividade e o índice zero de perdas das fazendas verticais, nas quais necessariamente nada dará errado.



Lindos prédios espelhados, condomínios de escritórios que até há pouco eram ocupados por executivos apinhados de MBAs, agora ostentam intermináveis e nada charmosos canteiros de chicória. Sem mais função, metade dos prédios da Avenida Paulista e da Berrini vêm seu metro quadrado despencar a preço de banana para a nascente megaindústria vegetal.



Adaptar o mesmo e revolucionário sistema produtivo às grandes extensões exigidas pela soja, algodão, arroz e milho é só uma questão de tempo. De pouco tempo.



Se os prestadores de serviço em sistema home office passam a receber em suas casas, a preços ridiculamente baixos, alimentos de qualidade insuperável, em contrapartida toda uma cadeia produtiva está fadada à ruína em efeito dominó: fábricas de defensivos, implementos agrícolas, fornecedores de propriedades rurais, mão de obra de baixa e alta qualificação do agronegócio, caminhoneiros, centrais de abastecimento, concessionárias de rodovias, indústrias de autopeças, quitandas e minimercados de bairro, etc.



Todo esse assustador contingente de desocupados sucumbirá, mais cedo ou mais tarde, por fome, sede ou doença. E os prestadores de serviço, que se supunham a salvo em seus escritórios domésticos, constatarão que quase tudo o que faziam tinha relação, direta ou indireta, com aquele gigantesco exército de desempregados e seus dependentes.



Prosperando mesmo, só as fazendas verticais. Que também não resistirão à falência, por não terem a quem vender seus saborosos e nutritivos frutos.







Esta é uma obra de ficção.

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Imagem: istoe.com.br





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