“Sonhos
e realidade. Data estelar: Mercúrio e Netuno em quadratura; Lua cresce em
Aquário. Para efeitos cósmicos, é irrelevante que Tu te esforces em distinguir
teus sonhos daquilo que chamas de realidade, pois teu ser permeia todas as
circunstâncias com a imaginação. As coisas de tua vida não são coisas, são
representações, são significados, são cabides de tuas fantasias e imaginações.
Por isso, como podes Tu pretender que haja diferença entre o que chamas de
realidade e teus sonhos? O que sobraria dessa realidade se repentinamente todos
teus sonhos desaparecessem? Sobraria apenas tua perplexidade, um vazio
existencial do tamanho do Universo. Sonha, faze isso sem pudor nem temor,
entende de uma vez por todas que teus sonhos dão vida à realidade, que isso não
é alucinação, mas um poder que nossa humanidade utiliza de forma constante sem
sequer conhecê-lo inteiramente.” Oscar Quiroga
Hoje
vou escrever sobre uma história que apenas quem me conhece bem de perto – os
meus pais, a minha namorada – já me ouviu contar. História com h por se tratar
da narração de fatos, acontecimentos ou particularidades relativas a um
determinado assunto; acepção de número oito no nem tão “Novo Dicionário
Aurélio”, 1975.
Decidi
fazer isso por ter lido um trecho anteontem num livro que me impressionou
muito, dando-me coragem. E já está mais do que na hora desse tipo de
acontecimento deixar de ser tratado como tabu. Afinal, exemplos existem aos
montes, nas mais variadas áreas do conhecimento desde Jung até o sonho de Kekulé.
E
esta é a minha história: eu fiz a graduação em engenharia mecânica, engatei um
mestrado na sequencia para aprender mais sobre o método dos elementos finitos,
um assunto pelo qual me encantei desde o primeiro contato.
Explicando
de uma forma simples, trata-se de um procedimento matemático usado para
resolver problemas complexos da mecânica aplicada para os quais não temos a
solução exata, valendo-se da representação por um modelo computacional composto
de elementos mais simples, para os quais a resposta é conhecida.
Ainda
está difícil? Eu sei que está. Então vamos lá de novo. A gente pode calcular a
complexa estrutura metálica de um avião representando-a por tijolinhos. E daí,
como a gente conhece o comportamento físico dos tijolinhos (ou elementos finitos),
então a gente pode descobrir se o avião aguenta as cargas de voo e pouso para as
quais ele está sendo projetado, onde dá para aliviar peso da estrutura ou onde
esta precisa ser reforçada.
Eu
sei disso porque trabalho com estruturas aeronáuticas há quinze anos. Eu sei,
pode parecer loucura, mas eu gosto do que faço. Mas esta é outra história. A
história da gênese do Método dos Domínios Pontuais ou simplesmente MDP, como eu
decidi denominar.
A
minha família é simples e meus pais custearam com dificuldades o ensino
particular meu e do meu irmão em São João da Boa Vista – primeiro no Externato
Santo Agostinho e depois no Colégio Orion. E depois ainda a nossa moradia na
cidade de Campinas, para curtirmos em tempo integral a Unicamp do inicio da década
de noventa! Sei do esforço que fizeram por nós e lhes sou muito grato por isso.
Naquele
ano de mil novecentos e noventa e cinco eu estava na metade do mestrado, trabalhava
num problema aplicado a bomba injetora Bosch para motores a diesel e havia real
possibilidade de terminar o mestrado, deixar de viver das bolsas de estudos e
conseguir o meu primeiro emprego lá. Na verdade, já estava passando da hora de
eu desmamar da universidade; mas a gente sabe, são tortuosos os caminhos dessa
vida.
E
foi então, numa dessas viagens na maionese, que eu comecei a pensar: por que a
gente precisa usar esses malditos tijolinhos (elementos finitos) se quando eles
se deformam muito perdem a capacidade de representar os fenômenos da natureza?
Por que não representar as coisas por uma nuvem de pontos se somos constituídos
de átomos, de moléculas com prótons e nêutrons com elétrons a girar ao redor
destes, como as estrelas do céu noturno? Putz, que loucura!
Então
eu fui ter com o meu então orientador sobre estas minhas “questões” e ouvi dele
o meu primeiro sonoro não. “Se você quiser fazer doutorado comigo tem de
continuar os estudos que começou e eu não tenho o menor interesse em investigar
esse tipo de ideia.” E assim fui ouvindo outros nãos doutros professores da engenharia
mecânica e da matemática – vejam onde é que eu fui me meter, um cara tão normal
como eu.
Até
que eu conversei com o professor Renato Pavanello do Departamento de Mecânica
Computacional da Unicamp, uma pessoa muito bacana, que me ajudou muito na parte
final do trabalho e a quem sou muito grato também. E ele me disse: “Cara, essa
coisa de pontos é meio esquisita, eu não entendo muito disso, mas recomendo que
você converse sobre isso com o professor Iguti, lá do fundo do corredor.”
Figura
estranha aquele descendente de japonês baixinho, com uns óculos arredondados e
vasta cabeleira grisalha. O professor Fernando Iguti era formado em engenharia
aeronáutica pelo ITA e doutor pelo afamado Imperial College de Londres. Por
muitos considerado um gênio e também pessoa de grande humanidade, caráter e
simplicidade. E, vale mencionar isso, eu considero o Iguti a pessoa mais
inteligente que tive a oportunidade de conhecer pessoalmente (até hoje). Ele me
disse: “Você deve ser meio maluco, eu não entendo direito o que está falando, mas
esse treco – ele gostava de usar a palavra treco a torto e a direito – me
parece fazer algum sentido.” E me deu o seu primeiro conselho: “Para de pensar
nisso e termina o seu mestrado. Daí, depois, eu posso sim te orientar no doutorado.”
Ei
você, não dorme não! É agora que a história começa, é isso que eu nunca expus
publicamente: eu durmo muito. Preciso de umas nove horas de sono por noite.
Naquela época, principalmente nos três primeiros anos do doutorado, de 1996 até
1998, era muito comum eu sonhar que estava sendo ensinado sobre o Método dos
Domínios Pontuais. Mas que porra é essa?! Isso mesmo, sempre que eu enfrentava
uma dificuldade nas minhas pesquisas, era batata: à noite eu dormia e sonhava
estar numa pequena sala, com uma mesa, cadeira de um lado e cadeira do outro, de
frente para uma pessoa que eu nunca consegui identificar o rosto e essa pessoa
me explicava como eu devia proceder. No outro dia pela manhã eu só precisava
decodificar o sonho, botar em equações as ideias, programar no computador e
voilà... o treco funcionava!
Lembro-me desses anos maravilhosos com grande
entusiasmo. Eu encontrava-me com o professor Iguti toda a sexta-feira às duas
horas da tarde. Então eu contava para ele o que eu havia feito ao longo da semana.
E ele era espécie de advogado do diabo oops, perdão, advogado dos elementos
finitos. Ele me dizia: “Tudo bem, com esse seu treco dá pra resolver esse
problema; mas com elementos finitos da pra fazer isso, aquilo e mais aquilo
outro! Será que esses seus domínios pontuais também conseguem fazer isso?” E
daí pronto... estava com a cabeça cheia de problemas para mais uma semana.
O
professor Iguti tinha um hábito estranho. Quando terminávamos as nossas reuniões
de sexta, ele punha uma única bala japonesa sobre a mesa, bem a minha frente (ou
não). Era a forma de ele dizer que estava satisfeito com os progressos da
semana. O que ele não sabia é que eu tinha esse meu outro professor, que a
noite me ajudava com as questões às quais estava ocupado. E quase sempre eu
levava a bala japonesa para casa.
Já
mais para o final do trabalho o professor Iguti me disse que eu precisava ir à
biblioteca, que eu precisava ler uns artigos, porque precisava ao menos de uma
revisão bibliográfica para a introdução daquele treco que eu estava inventado.
Eu nunca pensei assim. Sei que eu trabalhei muito, que eu fiz por merecer, mas
eu não inventei nada. Eu era um decodificador de sonhos; eu botava no papel as
equações e testava-as no computador. Elas simplesmente funcionavam como deve
ser uma forma eficiente de se representar os fenômenos da natureza.
Bem,
essa é a história do MDP. Acho que por isso, logo na primeira frase dos
agradecimentos, eu escrevi em minha tese: “Agradeço, acima de tudo, a Deus,
pela Sua inspiração e proteção.”
O
ano era 1866: “Aos 62 anos, Kardec queria acelerar o trabalho, lançar novos
livros e fazer novas revelações antes que fosse tarde demais e seu tempo na
Terra se esgotasse. Um engano, segundo o porta-voz dos espíritos:”
“–
De que serve correr? Não te dissemos muitas vezes que cada coisa virá a seu
tempo e que os espíritos prepostos ao movimento das ideias sabem fazer que
surjam circunstâncias favoráveis?”
“Para
não correr o risco de correr o risco de ser punido por ‘suicídio involuntário’,
Kardec rendeu-se ao descanso e, na noite de 24 de abril, foi surpreendido por
um sonho misterioso.”
“Ao
passar por uma rua desconhecida, deparou-se com grupo de homens entretidos com
uma conversa quase inaudível. No canto de uma parede, logo atrás, viu uma inscrição
com letras miúdas, brilhantes como fogo, que se esforçou para decifrar:
‘Descobrimos que a borracha enrolada sobre a roda faz uma légua em dez minutos
pela estrada (...)’.”
“A
frase foi desaparecendo, pouco a pouco, antes de Kardec ter tempo de concluir a
leitura. Ao acordar, ele trazia uma série de interrogações:”
“–
O que significaria aquela borracha capaz de fazer uma légua em dez minutos?
Seria a revelação de alguma nova propriedade desta substância? Ela
desempenharia algum papel na locomoção? Querem pôr-nos no caminho de nova
descoberta? Mas por que, então se dirigiram a mim, em vez de a especialistas,
com tempo para realizar os estudos e experiências necessários?”
“As
respostas viriam do além. Não através do sumido Espírito da Verdade, mas em
nova mensagem assinada pelo médico Demeure:”
“–
O que vistes são encarnados que se ocupam, em diferentes partes do mundo, de
invenções destinadas a aperfeiçoar os meios de locomoção. Uns têm pensado na
borracha, outros em outras matérias. Mas o que existe de particular nesse sonho
é que quiseram chamar-vos a atenção, como objeto de estudo psicológico, para a
reunião, num mesmo lugar, de espíritos de diferentes homens dedicados ao mesmo
fim.”
“Estas
reuniões de trabalho aconteceriam com frequência quando os homens deixavam seus
corpos, durante o sono, para se encontrar, em espírito, em diferentes pontos do
planeta. Ao despertarem depois destas longas confabulações sobre descobertas e
invenções em comum, voltavam a desenvolver suas pesquisas, longes uns dos
outros.”
“Kardec
revelou seu sonho em reportagem na Revista Espírita.”
“Premonição?”
“Não.
Para os adversários, mera ignorância. Em 1840, Charles Goodyear já descobrira o
processo de vulcanização da borracha; cinco anos depois, os irmãos Michelin patentearam
o pneu para automóvel; e, em 1847, Robert Thompson inserira, pela primeira vez,
câmaras de ar em pneus de borracha maciça.”
“Revelação?”
“Sim,
de acordo com os aliados. Afinal, só vinte anos depois deste sonho, a partir de
1888, o pneu passaria a ser fabricado em larga escala na Europa e nos Estados
Unidos.”
“Nem
mesmo em sonho Kardec estava livre de polêmicas.” – Trechos extraídos de
‘Kardec: a biografia’ de Marcel Souto Maior, Record, 2013.
Porque
ainda sou Criança procuro manter a mente aberta ao Novo e os pensamentos
Elevados.
– Dedicado aos meus Amigos Bellini e Takashi, que
não me deixam beber sozinho.
1 Comentário
Caro amigo Xerxes,
É um prazer usufruir de suas palavras e imagens.
Adoro novidades!
Abraços,
Tânia.
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